quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Carta.

Porque vezenquando eu sinto uma saudade danada de você. Não teria nem em sonhos coragem de falar isto a você hoje em dia, pois assisto de longe a sua felicidade.
Mas ao ouvir tua voz mansa, meu coração dá um aperto bobo e as memórias caem em minha mente como uma cachoeira desenfreada. Lembro das nossas cervejas quentes e que eram tão ardorosamente degustadas pouco antes de nos atirarmos um nos braços do outro.
Lembro das repetidas vezes que em meio a abraços éramos interrompidos pelo choro que vinha do outro quarto, e você, em sua infinita paciência, sorria e me dava um breve beijo na testa com a mão encostada em minha bochecha.
Um desperdício, creio eu. Um desperdício de tanto amor.
E agora um desperdício de saudade.
Não porque não valha a pena sentir sua falta. Você sempre valeu a pena.
Mas porque não vale a pena que esta curta distância que nos separa faça tanto mal.
Havia em nós um trato, uma amizade além dos beijos corriqueiros no pequeno apartamento.
Eu era sua, mesmo não sendo. E vice versa.
Quando seu caminho começou a seguir para a sua nova vida, nós ainda discutíamos sobre isto e ríamos das psicopatias alheias. Nós éramos uma boa dupla.
Sempre nos entendemos e sempre nos acolhemos em qualquer momento ou em qualquer tortura mental que dissipava nossa tranquilidade.
Fazíamos bem um pro outro enquanto tomávamos cerveja sentados no carpete do apartamento ouvindo repetidamente as mesmas músicas que você não aguentava mais.
Você me fazia bem enquanto dedilhava um som qualquer, pra em seguida, derramar cerveja e me beijar apaixonadamente como um pedido de desculpas.
Ríamos descaradamente dos absurdos que já ouvimos, ríamos dos filhos da lua e dos extraterrestres em suas figuras paternas. Ríamos também só por rir.
Depois disto, mesmo que secretamente, nos falávamos para saber um do outro. Tínhamos uma palavra secreta engraçada e um amigo invisível chamado Pedro.
Eu sinto muita falta deste cuidado supremo que nos mantinha entrelaçados mesmo distantes. Eu senti falta quando você não cumpriu o acordo que fizemos sentados naquela mesa do posto, já bêbados, e concordamos em sempre ter um ao outro secretamente.
Eu sei que a provável causa da quebra do nosso acordo tenha sido a sua busca pela felicidade em minha ausência, mas a realidade é que eu sinto falta da sua voz mansa e doce e de seus arpejos sintonizados com o coração.
Dia desses eu estava caminhando pelas ruas de um Rio antigo, quando ouvi alguém chamar seu nome. Olhei imediatamente com alguma esperança de que os boatos de que você viria para cá eram verdadeiros e você estava aqui. Mas quem respondeu foi o dono da banca de jornal, gordo e de cabelos brancos e com um rosto brevemente desconfiado.
Eu sabia que, no fundo, não era você, mas ao ouvir seu nome nada comum pelas ruas de Copacabana, eu me lembrei de que eu sempre vou sentir saudades suas e da sua alma tão cândida.
Com carinho e muita saudades, de dentro.

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Tenta-a-ação;

Arde
o fogo
do desejo.

Anseio,
em minhas vísceras
teu beijo.

De quatro
(estações) fugimos,
para entender.

Essa malícia,
que é amor
e prazer.




quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Doce.

Um café amargo, um menino doce,
um sorriso, um abraço, uma música bonita, um conto obsessivo.
eu, você e todos os nossos vícios.

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Um quarto.

Ela estava sentada na cama olhando fotos antigas de um tempo em que seu sorriso fluía tanto quanto sua alma em alegria. Pensava em como foi feliz. Dos amores que viveu, dos amigos, dos abraços repartidos em tardes ensolaradas em uma cidade pacata.
Um quarto. Um quarto de século, e ela nunca teve tão pouca vontade de viver.
Os dias são mastigados e cuspidos.
Os meses passam se arrastando e ela não consegue ver nada além de mais dias estupidamente mal acabados no ano novo que chegou.
Um quarto. Um quarto de século.
Sua apatia desestrutura sua mocidade.
Vai levando os dias um por um, sabendo que o fim da noite trará o azedo e fétido cheiro da amargura.
As marcas já são só marcas. As cicatrizes são só cicatrizes.
Mesmo que com faca afiada encostasse nelas, não doeria mais. A tudo ela se acostuma.
Uma tenra idade, o perdão, a noite, a cidade.
Tudo que a encantava, hoje é musgo no coração empedrado.
Talvez seja resultado daquela grande decepção, talvez arrependimento, talvez a culpa seja dela.
Ela não gosta de sentir pena de si mesma e então limpa rapidamente a lágrima que há tempos estava guardada e ela não deixava cair.
Voltou a si, sorriu seu sorriso ensaiado e foi dormir, ciente de que amanhã seria mais um dia.
Mais um.
Um quarto, um quarto de século.
Mas pareciam ter sido séculos inteiros dentro de um quarto.